COM SELIC EM 2,75% AO ANO, QUAL É O FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO MAIS BARATO?
COM SELIC EM 2,75% AO ANO, QUAL É O FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO MAIS BARATO?
Por Giovanna Sutto – 18 mar 2021
Nesta quarta-feira (17), o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu elevar a taxa Selic pela primeira vez em seis anos, levando a meta da taxa básica de juros da economia de 2% para 2,75% ao ano. A última vez que o Copom subiu a Selic no país foi em 29 de julho de 2015, quando a taxa básica de juros passou de 13,75% para 14,25%.
O anúncio interrompe um ciclo de queda da Selic, que vinha acontecendo há alguns anos, mas que entre junho de 2019 e agosto de 2020 apresentou um tombo significativo: a Selic caiu de 6,5% a.a. para 2% a.a., sua mínima histórica. “Esse movimento de redução de juros mais recente impulsionou a tomada de financiamento imobiliário no ano passado”, segundo Alberto Ajzental, coordenador do curso em Desenvolvimento de Negócios Imobiliário da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Os financiamentos imobiliários subiram 57,5% de 2019 para 2020 em termos de volume financeiro, atingindo um valor recorde de R$ 123,97 bilhões no ano passado, segundo dados da Abecip, associação que representa as entidades de crédito. O número superou o pico anterior registrado em 2014, quando o mercado residencial operava em ritmo acelerado.
Além de taxas mais baixas, o tomador passou a ter acesso a um leque maior de opções de financiamento nos últimos anos. Além da tradicional modalidade de crédito imobiliário, que cobra uma taxa fixa mais a Taxa Referencial (TR; atualmente zerada), a Caixa lançou uma nova linha de financiamento corrigido pelo IPCA em agosto de 2019. Mais recentemente, Itaú, Bradesco e Caixa lançaram outra linha, dessa vez atrelada à poupança.
Segundo Fabio Tadeu, economista e sócio da Brain Inteligência Estratégica, além do juro baixo, há mais crédito disponível no mercado diante da captação recorde da poupança em 2020, que alcançou R$ 166,3 bilhões no acumulado do ano. “Foi fundamental essa abundância no funding [fonte de recursos para os financiamentos], porque então os bancos conseguem atender a alta na demanda. É um círculo virtuoso”, afirma.
Diante desse cenário, mas considerando a alta da Selic anunciada ontem, qual é a melhor opção para realizar o sonho da casa própria? E o que considerar na decisão?
Compare as simulações de financiamento imobiliários
A simulação considera dois imóveis: um de R$ 500 mil e outro de R$ 800 mil, sendo 60% dos valores financiados, em um prazo de 360 meses. O estudo leva em conta as taxas às quais a plataforma tem acesso, conforme as parcerias que mantém com os bancos. São taxas médias, que podem variar a depender da qualidade da relação do cliente com o banco.
Foram consideradas três modalidades: a tradicional taxa fixa corrigida pela TR; a taxa fixa corrigida pelo IPCA; e a taxa fixa corrigida pela remuneração da poupança. Em relação aos indexadores, foram considerados dois cenários: o primeiro considera as condições atuais, Selic em 2,75% a.a., e o IPCA acumulados dos últimos 12 meses (5,2% a.a.); e o segundo considera as projeções para o fim de 2021 do boletim Focus do Banco Central, que prevê Selic a 4,5% ao ano e IPCA 4,6% a.a.
Em um contrato longo – como no caso de um financiamento imobiliário, que pode durar 30 anos -, não há como prever com exatidão o patamar dos indexadores. Portanto, a simulação é um mero exercício para ilustrar como os custos podem mudar diante das alterações nos indexadores.
As cotações foram feitas com base no Sistema de Amortização Constante (SAC), tipo de financiamento no qual as parcelas vão diminuindo com o passar do tempo.
Qual modalidade escolher?
Considerando as premissas da simulação, o financiamento imobiliário do Itaú atrelado à poupança seria o mais vantajoso no cenário um, para os dois valores de imóveis. No cenário dois, que considera a Selic maior e o IPCA para o fim de 2021, as taxas ficam próximas, mas a modalidade de taxa fixa atrelada à TR da Caixa se torna mais vantajosa para os dois valores de imóveis simulados.
Segundo os especialistas consultados, ainda que a modalidade da poupança possa ficar mais cara em um cenário de alta da Selic, que inclusive é o cenário mais esperado hoje, existe uma trava para os juros nessa modalidade.
Nessa linha, o tomador paga os juros fixos, como os 3,99% no caso do Itaú, e a remuneração da poupança, que é limitada a 6,17% a.a. mais a TR.
O teto existe porque a poupança rende 70% da Selic mais a TR quando a Selic é menor ou igual a 8,5% a.a. Se a taxa básica passa de 8,5% ao ano, ela retorna à regra antiga e passa a render 6,17% a.a. mais a TR (ou 0,5% ao mês mais a TR), que é sua remuneração máxima. Assim, no Itaú, por exemplo, os juros nunca passam de 10,16% ao ano (3,99% + 6,17%) na modalidade.
“O consumidor precisa entender que a opção indexada à poupança conta com uma taxa flutuante [remuneração da poupança] que é indexada à Selic, porém é limitada a 10,16%, o que faz com que seja possível avaliar a capacidade de pagamento. Além de haver esse limite, hoje essa é a melhor opção. Fechar um financiamento com a taxa de 5,7% é o melhor negócio possível nas atuais condições”, diz Fabio Tadeu, economista e sócio da Brain Inteligência Estratégica.
Dario Ferraço, sócio da SF Consultoria, avalia, no entanto, que mesmo com essa trava, o financiamento pode ficar muito desvantajoso. “Se a Selic subir para o patamar acima de 8,5% a.a., a taxa supera o que você encontra hoje em outras modalidades, como o IPCA, por exemplo. Considerando que são contratos longos, isso deve ser levado em conta”, explica.
Mas nem é preciso imaginar uma elevação tão forte da Selic. Como é possível observar na simulação, mesmo com a taxa básica subindo para 4,5%, conforme indicam as projeções para 2021, a modalidade da poupança já perde sua vantagem.
O economista da Brain Inteligência Estratégica lembra, ainda, que uma possibilidade é realizar a portabilidade de crédito, em caso de elevação da Selic. Assim, caso a linha fique relativamente mais cara futuramente é possível trocá-la por uma dívida mais barata mais para frente.
Colocando a portabilidade na conta, à primeira vista, a opção mais lógica seria escolher o financiamento mais barato hoje e, conforme for, migrar para outro depois. Porém, vale dizer que, na prática, alguns bancos dificultam o processo de portabilidade, que pode ser extremamente burocrático. O tomador que escolher a modalidade da poupança hoje, por exemplo, por ser a mais barata atualmente pode ter um benefício por um período muito curto – já que as projeções são de alta do rendimento da poupança -, que pode não compensar o trabalho que ele terá para fazer a portabilidade.
Perfil do cliente é importante
Para tomar a decisão final, os especialistas recomendam que o cliente avalie, para além das taxas, seu perfil de consumidor e de crédito. Ou seja, qual é a melhor opção disponível conforme seu orçamento e momento de vida.
“O modelo corrigido pela poupança é mais adequado para um perfil moderado. É para o cliente que deseja garantir a melhor taxa no momento da contratação do crédito, porém, com um indexador que pode sofrer variação futura, por meio da Selic. Então, há o risco de alta da taxa do contrato, e o consumidor precisa entender se tem orçamento para lidar com essa alta”, avalia Ferraço.
Já a taxa fixa mais TR é indicada para os conservadores. “É a modalidade mais tradicional, não tem surpresas. É mais indicada quando o cliente não tem projeção de antecipar a quitação do financiamento, ou seja, sua programação está atrelada ao valor da parcela, deseja cumprir todo o processo no prazo previsto no contrato”, explica.
Ferraço pontua ainda que a TR fica mais vantajosa no cenário de alta da Selic e do IPCA porque sofre menos variações. “Quando você tem um indexador volátil, como é o caso da Selic na modalidade poupança, a alta da taxa pode significar uma prestação mais cara já neste ano, como mostra a simulação. Por isso, nesse cenário de um futuro próximo, com exceção do Banco do Brasil, as taxas fixas mais TR dos bancos podem ser atrativas também por estarem menos expostas à tamanha volatilidade”.
Ainda assim, vale lembrar que hoje a TR está zerada, mas pode subir em um cenário de elevação dos juros (entenda a TR e como ela é calculada).
Já a modalidade corrigida pelo IPCA seria indicada para um tomador mais agressivo, já que as correções que o indexador pode sofrer não têm limites. “É recomendada para clientes que podem fazer um financiamento mais curto, de cerca de 10 anos, e que têm a possibilidade de quitar caso o IPCA dispare ao longo do contrato”, explica Ferraço.
Além de ser mais arriscada, a opção atrelada ao IPCA tem um custo muito maior que as outras modalidades hoje e, mesmo no cenário projetado, no qual o Focus indica uma queda do IPCA dos atuais 5,2% para 4,6% a.a. ao fim de 2021, a linha ainda segue sendo mais cara.
Atenção ao CET
Independentemente da modalidade que o cliente escolher, é importante observar o Custo Efetivo Total (CET) da operação, taxa que mostra efetivamente o que vai sair do bolso do consumidor.
“O CET inclui todas as despesas do financiamento que vão além dos juros do empréstimo, como os custos da contratação em si; tarifas operacionais; e os seguros obrigatórios, cujos preços variam de banco para banco”, diz Azjental.
Ainda que a taxa de juros seja um componente importante para formar o custo final do financiamento – e o dado mais mencionado pelos bancos aos clientes -, não é seu único custo. Portanto, olhar o CET pode ser também uma boa forma de decidir qual será a melhor modalidade de crédito e o melhor banco.
Mesmo com a Selic subindo, cenário é positivo para compra
Apesar da elevação da taxa básica de juros, os especialistas defendem que o momento ainda é propício para a compra do imóvel. “A alta da Selic ainda não é significativa a ponto de impactar as taxas de financiamentos. E os juros continuam nos menores níveis da história. Além disso, o imóvel é um investimento de longo prazo. Há ciclos de aumento e queda de preços, mas a volatilidade não é muito grande”, diz Bruno Gama, CEO da Credihome.
Gama vê um aumento de preços dos imóveis no médio prazo, mas também ressalta que as taxas dos financiamentos devem seguir atrativas. “Um reajuste de preços ainda que pequeno deve começar a partir do segundo semestre quando, historicamente, a demanda é mais forte. Então, temos um segundo semestre em que a demanda sobe, o preço dos imóveis pode ter um reajuste, e a taxa de juros também pode sofrer um aumento mais forte, portanto o custo do financiamento pode subir também. Mas ainda não será relevante a ponto de frear os negócios, teremos boas oportunidades”, diz.
Eduardo Zylberstajn, coordenador de pesquisas da Fipe, acrescenta que como a compra de um imóvel, ainda mais financiado, é uma decisão pensada para o longo prazo, não deveria ser afetada por movimentos pontuais no curto prazo. “Quem tem estabilidade financeira e sabe que vai ficar alguns anos nessa dívida pode aproveitar os juros atuais, que estão historicamente baixos”, diz o economista.
Gama acredita que o boom nos financiamentos deve permanecer, mesmo com esse ligeiro aumento da taxa, porque o crédito imobiliário será cada vez mais será estratégico para os bancos em um ambiente mais competitivo, com Pix e Open Banking funcionando. “Ter um cliente com financiamento imobiliário significa manter uma relação por cerca de de 30 anos. É fidelizar. Por isso, os bancos devem buscar taxas competitivas e produtos que atraiam os clientes”, afirma.